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O vereador Fernando Holiday

O vereador Fernando Holiday, 20, em seu gabinete na Câmara Municipal

 

JULIANA GRAGNANI
DE SÃO PAULO

Fernando Holiday, 20, subverte todas as expectativas. A começar pelo nome: Fernando Silva Bispo adotou “Holiday” em homenagem à cantora Billie Holiday, do hino antirracista “Strange Fruit”. Mas “música não tem nada a ver com ideologia”, diz ele, o vereador mais jovem de São Paulo, negro, gay e contrário aos movimentos negro e LGBT.

A discussão sobre apropriação cultural —em que um grupo questiona a adoção de elementos de uma cultura por outro— é “coisa de gente que não tem o que fazer”, e o debate sobre as marchinhas politicamente incorretas aponta para uma migração da esquerda do campo da política, onde foi derrotada, ao da cultura, onde “tenta sobreviver”, diz o vereador do DEM e integrante do MBL (Movimento Brasil Livre).

Na Câmara, é ao mesmo tempo autor de um pedido de cassação da colega Juliana Cardoso (PT) e alvo de um pedido de cassação produzido pela bancada petista, frutos de um bate-boca na semana passada. Um membro de seu gabinete acompanhava um YouTuber que abriu a porta da sala da liderança do partido do PT a fim de interromper uma reunião. Mais tarde, durante a sessão, Cardoso foi na direção de Holiday, gritando que era um “moleque”.

Bem-articulado, mas com olhar sempre direcionado para baixo, o vereador diz ter economizado 60% da verba de gabinete e 100% daquela para materiais (R$ 23 mil) em seu primeiro mês —a Câmara ainda não divulgou a prestação de contas de janeiro.

Planeja retomar o curso de direito no Instituto de Direito Público, onde completou o primeiro semestre, e mudar-se para o centro. Por enquanto, diz pegar carona todos os dias de sua casa, o sótão do escritório do MBL, na Vila Mariana (zona sul), até a Câmara.

Você é negro e homossexual. Seus críticos dizem que você é racista e homofóbico. Você se considera assim?
Nem um pouco. Esses ataques correspondem a um susto da militância que, por muito tempo, disse representar essas minorias. Sou contrário às cotas raciais, apesar de ser favorável às cotas sociais porque os pobres no Brasil sofrem de igual forma. Diferenciar pobres e negros e pardos cria uma divisão desnecessária e incita ódio e preconceito.

Dizem que você só tem visibilidade porque é um jovem negro disposto a corroborar o pensamento dominante.
É um discurso fraco, porque muitas das minhas propostas são justamente para beneficiar os mais pobres, dando a eles maior poder. Cheguei aqui principalmente devido à indignação de brasileiros que foram às ruas, das mais diferentes classes sociais, religiões, grupos raciais, uma diversidade muito grande e cansada de como a política estava sendo levada e que queria algo diferente. Acho que represento esse sentimento.

O que pretende fazer pelos pobres? E pelas minorias?
A maior luta vai ser contra a burocracia. Procurar parcerias com a iniciativa privada para beneficiar essa população, agilizar processos que, dependendo só do serviço público, demoram muito tempo.

Quanto às minorias, acredito que muitas das políticas sociais implantadas na tentativa de se combater esses preconceitos vêm falhando. É um processo que não dá para mudar com uma legislação, mas por meio do exemplo. Quanto mais gays, lésbicas, bissexuais, negros e outras tantas minorias conseguirem demonstrar à sociedade que sim, são capazes de alcançar o sucesso pelo mérito e, tendo oportunidade, são capazes de fazer um bom trabalho, aí sim você vai vencer o preconceito.

Mas como terão oportunidade?
Não deve haver política separada para os negros nem os LGBT. Essas pessoas devem ser englobadas em todos os programas sociais que existirem no serviço público.

À revista “The Economist”, você disse que o movimento contra marchinhas politicamente incorretas surgiu por causa do impeachment de Dilma Rousseff. Por quê?
O impeachment foi uma sinalização da queda da hegemonia da esquerda. Enquanto o PT esteve no poder, as ideologias à esquerda tiveram uma predominância natural. O impeachment é a queda desse monopólio.

Com milhões de pessoas indo às ruas contra um governo de esquerda, surge outro lado latente, outra versão. Logo, aqueles que estavam predominando e que estão em queda precisam reagir. Boa parte dessa reação vem pelo caminho cultural.

O debate sobre apropriação cultural segue essa lógica?
É conversa fiada, coisa de gente que não tem o que fazer. Vivemos em uma sociedade livre. Em um mundo diversificado, onde se aceita o diferente. Deveria ser justamente o contrário. Essas pessoas que homenageiam outras culturas deveriam ser mais ouvidas. E por que não dizer que estão espalhando culturas que poderiam ficar restritas em determinadas localidades?

Por que deletou vídeos antigos do YouTube em que dizia coisas como: “Então vamos fazer cotas para ‘gostosa’ porque tem muito lugar aí que está faltando. A FFLCH [Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP] que o diga: se fosse assim, não seria aquele zoológico, aquele pulgueiro”? Tem vergonha de comentários como esse e o considera machista?
Eram outros estilos de vídeo. O caminho ali era buscar o debate por meio do humor. Quando começam as manifestações, o impeachment passa a ser o foco do movimento, e a gente acaba aderindo a um perfil mais sério. Não tenho vergonha, mas tenho cautela para que as pessoas não confundam o que era o projeto de início com o que é agora.
Queria fazer uma provocação. As cotas raciais oferecem um privilégio ou separam as pessoas de acordo com a sua aparência. Você pode divergir se uma pessoa é negra ou não da mesma forma que pode divergir se uma mulher é gostosa ou não. Alguns vão achar machista. Não acho que seja.

Ser negro é só aparência?
Temos um país miscigenado. É impossível dizer que haja descendentes diretos de escravos por conta da grande mistura. O brasileiro tem uma identificação com o continente africano. Somos todos brasileiros e dane-se a cor da pele e se você se sente ou não parte de um determinado grupo.

Servidor de seu gabinete acompanhou um YouTuber que abriu a porta de uma sala onde a liderança do PT se reunia. Considera essa uma atitude razoável? Vai puni-lo?
Não houve invasão. Meu assessor sequer chegou a entrar, estava de fora. Houve exagero completo. Impedi-lo de circular no corredor ou de filmar qualquer coisa já é demais.

O MBL apoiou o impeachment de Dilma. Estão satisfeitos com o governo de Michel Temer (PMDB)?
Não. O governo Temer tem diversos erros. Quando tentaram manter Romero Jucá como ministro do Planejamento, atacamos, cobramos a saída. Recentemente não achamos adequada a nomeação de Moreira Franco. Agora vamos voltar às ruas, principalmente em defesa da Operação Lava Jato.

Não demorou para o MBL voltar às ruas, considerando todas essas insatisfações?
Não, porque há outros meios que não as ruas de cobrar. No caso do Romero Jucá, havia forte tendência do governo de mantê-lo como ministro, e a pressão das redes sociais acabou forçando-os a voltar atrás. É uma sinalização do poder que esses movimentos acabam tendo pela internet, que acaba substituindo a manifestação de rua.

RAIO-X

Idade 20 anos

Formação Cresceu em Carapicuíba (Grande SP), estudou em escolas públicas e está com o curso de direito no Instituto de Direito Público trancado

Carreira Política Integrante do Movimento Brasil Livre desde 2015, é filiado ao DEM

Fonte: Folha de São Paulo

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